
Durante mais ou menos um mês, eu li o A cura de Schopenhauer, de Irvin D. Yalom. No começo, estava meio retesado, o livro é muito técnico, muito enfadonho. Então, do nada, me vi envolvido na estória. Passava o dia todo pensando no que aconteceria, no rumo que tomaria depois daquele acontecimento... E terminei ontem, emocionado, sentindo que cresci como ser humano.
A Cura de Schopenhauer conta a história de um psiquiatra, o inteligente e envolvente Julius Hertzfeld, que, após anos de trabalho (não me lembro bem quantos anos agora..) se descobre com apenas um ano de vida pela frente. Até aí, clichê. Quem nunca viu uma história em torno de uma vida com data de validade? Então, derrubando todos os clichês possíveis, aquela coisa de "viver cada dia e fazer dele um melhor dia do que foi no dia anterior" ou ainda aquele fato da pessoa se deprimir e aguardar a morte, paciente e miseravelmente idiota. Julius não. Ele decide viver como sempre viveu. Trabalhar, comer (agora sem tanta preocupação com ela), fazer as coisas que sempre fez, viver normalmente.
Eu achei fantástico. Não sei se conseguiria. Você conseguiria? Um ano de vida pela frente e, simplesmente, você vai continuar indo à escola, continuar trabalhando, continuar jogando The Sims? Não sei.
Julius resolve, por ser um psiquiatra renomado e que já tinha resolvido inúmeros casos, resgatar antigos pacientes e saber, sem compromisso, como a pessoa estava vivendo depois da cura ou da não-cura. É nesse momento que o personagem Phill é apresentado. Phill foi um paciente de Julius, viciado em sexo e em relacionamentos "nada sérios". Phillip seguiu, por vários anos, a filosofia de que se encontrar com uma mulher mais que duas vezes era loucura. Ele apenas a levava para jantar, falava algumas coisas bonitas e a levava para cama. Por três anos, Julius fez de tudo para "curar" Phill. Em vão. Phillip larga a terapia, sem cura, sem melhora.
Julius reencontra Phillip e se surpreende. Phill agora já não é um Engenheiro Químico e sim aspirante a terapeuta. Imagine, um homem tão impessoal como Phillip, querendo ser terapeuta. É nesse momento que a palavra tão complicada Schopenhauer entra na estória, dando o rumo do enredo. Phill conta que, através do que Schopenhauer disse em seus vários artigos filosóficos, curou não só o vício pelo sexo, mas toda a vivência social que ele tinha e não gostava.
A partir daí, o livro se divide em setores. Em capítulos, é narrado a estória de Julius e sua incansável busca por não perder a trilha da vida e enlouquecer, em outros, a estória do filósofo Arthur Schopenhauer, sua vida e obra.
O livro passa a narrar o convívio de um grupo de terapia. Eu nunca tinha me informado sobre isso e achei interessantíssimo. Phill entra para o grupo de terapia de Julius com a condição de que Julius aprenda um pouco mais sobre Schopenhauer e assim, de um modo torto (Phillip é bastante frio, distante, quase incapaz de estabelecer um contato social) ajudar Julius a enfrentar a morte.
O grupo de terapia é formado por Pam, uma mulher que foi deixada, ao mesmo tempo, por marido e amante; Bonnie, uma gordinha que nunca teve sua existência exaltada por alguém; Stuart, um médico que não consegue se enturmar muito no grupo e que acaba sendo sempre apenas um "arquivo" do que foi dito, do que ficou para dizer; Tony, um sujeito estúpido, machista e irritado, mas de bom coração; Rebbeca, uma linda mulher que, na crise dos 40, se sente desolada por entrar nos lugares e não ser mais notada e Gill, com problemas alcóolicos e com a mulher.
A cada sessão, você aprende mais sobre os personagens e relações diversas. De leitor, você passa a um integrante do grupo, acompanha o desenrolar das angústias e conquistas de cada um, faz expectativas de como eles irão superar seus conflitos, seus medos. É incrível, gente.
Eu recomendo esse livro pra quem está tentando se entender. Pode parecer idiota, mas nem sempre temos total domínio de nossos sentimentos. Quem me conhece sabe que eu sempre estou em busca de crescer mentalmente, de controlar os tantos defeitos que carrego e por vezes, descarrego em terceiros.
Schopenhauer, ao longo de sua história, diz coisas incríveis. Uma das citações dele que me comoveram:
Como o nosso começo é diferente do fim! No começo, temos o delírio do desejo e o êxtase do prazer sensual: no fim, a destruição de todos os órgãos e o cheiro do cadáver em decomposição. O caminho, do nascimento à morte, é sempre um declive no bem-estaar e na alegria. Infância sonhadora, juventude alegre, vida adulta difícil, velhice frágil e em geral lastimável, a tortura da última doença e, finalmente, a agonia da morte. Não parece que a vida é um tropeço cujas consequências aos poucos ficam óbvias?
Fiquei pensado nisso e concordo. Mas, como no livro é abordado, não vale de nada vivermos se tivermos a visão pessimista de Schopenhauer onde, a base filosófica é a frase "Viver é sofrer". Portanto, acima de toda a visão pessimista, temos que enfrentar a vida. E no livro isso é amplamente discutido. Os personagens parecem vivos de tão bem feitos. Leitura agradável, às vezes muito difícil, mas ótima. Leiam, ou procurem um pouco mais sobre Schopenhauer. Muito pouco é abordado sobre ele, mas seus pensamentos são a base de muitos filósofos famosos, como Nietzche. Não vou me prolongar, outra hora venho falar sobre o Schopenhauer em si.
E você, que livro está lendo?

